quinta-feira, 21 de julho de 2016

De quem é a culpa? Uma opinião sobre a insatisfação arminiana e a Assembléia de Deus

De quem é a culpa? Uma opinião sobre a insatisfação arminiana e a Assembléia de Deus

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canceladoA Assembléia de Deus é uma igreja de confessionalidade arminiana. Porém o arminianismo nunca foi ensinado claramente e sistematicamente em nossas igrejas. Nunca tivemos em nossa EBD um trimestre cuja tema fosse Arminianismo. Se não fosse o advento da internet e principalmente das redes sociais muitos ainda estariam na ignorância do que seja calvinismo, arminianismo, pelagianismo etc.
Os arminianos tupiniquins, cuja maioria são de assembleianos e pentecostais, não devem a Editora CPAD pela proliferação de obras sobre esta soteriologia, mas a Editora Reflexão que tem lançado um livro após outro e contribuído para o estudo do arminianismo no Brasil e não só com publicações, mas na promoção de eventos com a presença de autores nacionais e internacionais.
Nossa igreja foi omissa, leia-se, alheia a educação deste tema. Relegando-o aos “doutores e mestres”, como se isso não fosse de interesse do membro comum. Logo não é de estranhar haverem dentro das ADs um contingente número de pastores e membros que são calvinistas declarados ou não (Imagino que as experiências eclesiásticas de muitos destes irmãos não sejam muito boas).
Em alguns grupos arminianos é explícito a insatisfação pelo avanço do calvinismo dentre os pentecostais e assembleianos e isso pelo menos por três motivos: a presença de calvinista dentre os autores publicados pela nossa Casa Publicadora ainda que a obra em si não trate do calvinismo; a presença constante de pentecostais nos eventos calvinistas como Consciência Cristã (VINACC) ou Conferência Fiel, por exemplo; e o fato de muitos assembleianos e pentecostais se assumirem calvinistas. Por estas e talvez outras razões há um movimento para impedir a “calvinização das Assembléias de Deus” que de tabela atinge a CPAD.
Estou certo que o artigo do pastor Silas Daniel na revista Obreiro que acabou gerando o debate entre ele, arminiano e o pastor Franklin Ferreira, calvinista, tenha acontecido em resposta a essa insatisfação. Do mesmo jeito a publicação das Obras de Armínio pela CPAD são respostas a reação arminiana. E isso é muito bom, pois o debate deve existir e obras sobre o Arminianismo a serem publicadas, principalmente por uma editora considerada arminiana. No entanto nem tudo são flores. Esta mesma reação arminiana foi responsável pelo cancelamento da palestra do pastor Augustus Nicodemus na CPAD Mega Store, cujo assunto era o tema de seu livro sobre os novos apóstolos.
Foi lamentável o que aconteceu e uma atitude fraca, sem profissionalismo nenhum de uma empresa que já está há muitos anos no mercado editorial evangélico. Ora não caberia a nenhum convidado falar do calvinismo numa empresa de confessionalidade arminiana ou vice-versa, a não ser que o evento fosse de teor acadêmico e se o tema fosse Soteriologia. Mas não foi o caso. Este é o ponto. Esta postura foi preconceituosa e revelou um sectarismo sutil dentro dos arminianos que eu desconhecia.
A pergunta que me faço é por que tudo isso tem acontecido nas Assembléias de Deus? Seriam os calvinistas os responsáveis? Ou nossa liderança errou em não se preocupar com formação teológica de nossos membros?
Em minha opinião não acho que os calvinistas sejam os responsáveis, afinal eles não invadem nossas igrejas e pregam para nossos membros sua soteriologia. Eles não têm culpa pelo fato dos pentecostais e assembleianos fazerem uso do Youtube para assistir pregações do Augusus Nicodemus ou Hernandes Dias Lopes. Por acessarem os cursos da Fiel de Formação de Líderes para aprenderem sobre História da Igreja, Hermenêutica, Homilética, Cristologia etc. Eles não têm culpa dos assembleianos trocarem os congressos de carnaval e festividades de igrejas com a presença de pregadores la Camboriú pela Consciência Cristã (VINACC). Eles não têm culpa se quando procuramos obras de peso teológico boa parte das publicadas no Brasil são de autores calvinistas ainda que o assunto não seja a doutrina da salvação. Não! Os calvinistas não têm culpa.
A culpa é ao meu ver da cultura anti-intelectual presente nas igrejas pentecostais já denunciadas por John Stott em seu livro “Crer é também pensar”, cuja a causa, segundo o teólogo James K. Smith, é a estranha tradição biblista, porém antiteológica de algumas igrejas evangélicas[1]. A culpa é da crise de púlpito que vivemos onde domingo após domingo ouvimos sermões vazios, sem coerência bíblica tampouco teológica, que no melhor dos casos não passam de um amontoado de versículos bíblicos, que de acordo com Stott não formam uma mensagem tanto quanto um milheiro de tijolos não formam uma casa. A culpa é da crise ministerial onde pessoas sem as qualificações bíblicas para o pastorado ou diaconato são consagradas gerando obreiros sem aptidão ao ensino, sem cuidado de si e nem tampouco da doutrina. A culpa é da neopentecostalização, já denunciada pelo pastor Ciro Sanches Zibordi[2], que vem ocorrendo na nossa denominação pela reprodução tanto de práticas como campanhas de vitórias atreladas a ofertas como meios de receber bênçãos, rituais de bênçãos mensais por dias de cultos frequentados, a redução da pregação do evangelho em mensagens triunfalistas e de autoajuda e a proliferação da teologia da prosperidade. A culpa é dos modismos pentecostais, do abuso dos dons, do charlatanismo espiritual, do desprezo das Escrituras pelo acolhimento da experiência como fonte de fé. A culpa é do semipelagianismo presente no legalismo institucional dos usos e costumes que não tem base bíblica e nem lógica alguma, no discurso errôneo sobre santidade, apresentada não como consequência, mas causa da nossa salvação. Tudo isso, penso eu, acaba levando uma membresia insatisfeita a beber de outras fontes onde encontram uma pregação expositiva substancial.
Se estes são mesmos os culpados, então não é combatendo irmãos calvinistas que vamos resolvê-los, nem tampouco boicotando eventos com a presença deles, mas lidando diretamente com as lacunas denominacionais. Doutrinando nosso povo dentro da nossa confessionalidade. Criando uma identidade muito além da estética, dos usos e costumes, mas na crença arminiana-pentecostal. Repudiando tanto a neopentecostalização quanto o semipelagianismo transvestido de santidade, mas que nega sua eficácia. Investindo na qualificação teológica e espiritual dos nossos pastores e obreiros. Valorizando nossas EBDs e reafirmando a identidade de nossos cultos de doutrina para que sejam de fato cultos de doutrina. Disciplinando os vendilhões do evangelho, os pregadores de fogo sem conteúdo, o comércio da itinerância e o estrelismo musical.
Por uma Assembléia de Deus fiel a sua confessionalidade pentecostal e arminiana, porém não-sectária e nem legalista.
Naquele que nos fez um em seu corpo,
Zé Bruno

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[1] SMITH, James K. Cartas a um Jovem Calvinista. Brasília: Editora Monergismo, posição 110 no Kindle
[2] ZIBORDI, Ciro Sanches. A Assembleia de Deus está se neopentecostalizando? Disponivel em:http://cirozibordi.blogspot.com.br/2012/09/a-assembleia-de-deus-esta-se.html Acesso em 20 de julho de 2016

Um comentário:

  1. Belíssima exposição dos fatos, nossos erros educacionais teológicos, que por todos os 105 anos de nossa denominação se mantém (mal formação de obreiros), não deve justificar a falta de educação e intolerância demonstradas ao Pastor palestrante. Isso é uma vergonha! Ainda bem que ele demonstra ser crente e não parece ter tomado nenhuma ação de reparação moral contra a CPAD.

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